Discursos Poéticos


 Tiago Mentor

26 de março de 2012

A internacionalização do mundo
O Globo-10/10/2000- Cristovam Buarque

Fui questionado sobre o que pensava da internacionalização da Amazônia, durante um debate, nos Estados Unidos.
O jovem introduziu sua pergunta dizendo que esperava a resposta de um humanista e não de um brasileiro.
Foi a primeira vez que um debatedor determinou a ótica humanista como o ponto de partida para uma resposta minha.
De fato, como brasileiro eu simplesmente falaria contra a internacionalização da Amazônia.
Por mais que nossos governos não tenham o devido cuidado com esse patrimônio, ele é nosso.
Respondi que, como humanista, sentindo o risco da degradação ambiental que sofre a Amazônia, podia imaginar a sua internacionalização, como também de tudo o mais que tem importância para a humanidade.
Se a Amazônia, sob uma ótica humanista, deve ser internacionalizada, internacionalizemos também as reservas de petróleo do mundo inteiro.
O petróleo é tão importante para o bem-estar da humanidade quanto a Amazônia é para o nosso futuro.
Apesar disso, os donos das reservas sentem-se no direito de aumentar ou diminuir a extração de petróleo e subir ou não o seu preço.
Os ricos do mundo, no direito de queimar esse imenso patrimônio da humanidade.
Da mesma forma, o capital financeiro dos países ricos deveria ser internacionalizado.
Se a Amazônia é uma reserva para todos os seres humanos, ela não pode ser queimada pela vontade de um dono, ou de um país.
Queimar a Amazônia é tão grave quanto o desemprego provocado pelas decisões arbitrárias dos especuladores globais.
Não podemos deixar que as reservas financeiras sirvam para queimar países inteiros na volúpia da especulação.
Antes mesmo da Amazônia, eu gostaria de ver a internacionalização de todos os grandes museus do mundo.
O Louvre não deve pertencer apenas à França. Cada museu do mundo é guardião das mais belas peças produzidas pelo gênio humano.
Não se pode deixar que esse patrimônio cultural, como o patrimônio natural amazônico, possa ser manipulado e destruído pelo gosto de um proprietário ou de um país.
Não faz muito, um milionário japonês decidiu enterrar com ele um quadro de um grande mestre. Antes disso, aquele quadro deveria ter sido internacionalizado.
Durante o encontro em que recebi a pergunta, as Nações Unidas reuniam o Fórum do Milênio, mas alguns presidentes de países tiveram dificuldades em comparecer por constrangimentos na fronteira dos EUA.
Por isso, eu disse que Nova York, como sede das Nações Unidas, deveria ser internacionalizada.
Pelo menos Manhattan deveria pertencer a toda a humanidade. Assim como Paris, Veneza, Roma, Londres, Rio de Janeiro, Brasília, Recife, cada cidade, com sua beleza específica, sua história do mundo, deveria pertencer ao mundo inteiro.
Se os EUA querem internacionalizar a Amazônia, pelo risco de deixá-la nas mãos de brasileiros, internacionalizemos todos os arsenais nucleares dos EUA.
Até porque eles já demonstraram que são capazes de usar essas armas, provocando uma destruição milhares de vezes maior do que as lamentáveis queimadas feitas nas florestas do Brasil.
Nos seus debates, os atuais candidatos à presidência dos EUA têm defendido a idéia de internacionalizar as reservas florestais do mundo em troca da dívida.
Comecemos usando essa dívida para garantir que cada criança do mundo tenha possibilidade de ir à escola.
Internacionalizemos as crianças tratando-as, todas elas, não importando o país onde nasceram, como patrimônio que merece cuidados do mundo inteiro.
Ainda mais do que merece a Amazônia. Quando os dirigentes tratarem as crianças pobres do mundo como um patrimônio da humanidade, eles não deixarão que elas trabalhem quando deveriam estudar; que morram quando deveriam viver.
Como humanista, aceito defender a internacionalização do mundo.
Mas, enquanto o mundo me tratar como brasileiro, lutarei para que a Amazônia seja nossa. Só nossa.
Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
É economistaeducadorprofessor universitário e político  brasileiro, membro doPDT. Atualmente é senador pelo Distrito Federal. Foi Ministro da Educação entre 2003 e 2004, no primeiro mandato de Lula. Nas eleições de 2010, foi reeleito para o cargo de senador pelo Distrito Federal, com mandato até 2018.

Morte Vida Severina – João Cabral de Melo Neto

—  Essa cova em que estás,
com palmos medida,
é a cota menor
que tiraste em vida.

— É de bom tamanho,
nem largo nem fundo,
é a parte que te cabe
deste latifúndio.

— Não é cova grande,
é cova medida,
é a terra que querias
ver dividida.

— É uma cova grande
para teu pouco defunto,
mas estarás mais ancho
que estavas no mundo.

— É uma cova grande
para teu defunto parco,
porém mais que no mundo
te sentirás largo.

— É uma cova grande
para tua carne pouca,
mas a terra dada
não se abre a boca.

João Cabral de Melo Neto 
Foi um poeta e diplomata brasileiro. Sua obra poética, que vai de uma tendência surrealista até a poesia popular, porém caracterizada pelo rigor estético, com poemas avessos a confessionalismos e marcados pelo uso de rimas toantes, inaugurou uma nova forma de fazer poesia no Brasil.
Irmão do historiador Evaldo Cabral de Melo e primo do poeta Manuel Bandeira e do sociólogo Gilberto Freyre, João Cabral foi amigo do pintor Joan Miró e do poeta Joan Brossa. Membro da Academia Pernambucana de Letras e da Academia Brasileira de Letras, foi agraciado com vários prêmios literários.








23 de abril de 2012

O ANALFABETO POLÍTICO – Brecht
O pior analfabeto
É o analfabeto político,

Ele não ouve, não fala,
Nem participa dos acontecimentos políticos.

Ele não sabe o custo da vida,
O preço do feijão, do peixe, da farinha,
Do aluguel, do sapato e do remédio
Dependem das decisões políticas.
O analfabeto político
É tão burro que se orgulha
E estufa o peito dizendo
Que odeia a política.
Não sabe o imbecil que,
da sua ignorância política

Nasce a prostituta, o menor abandonado,

E o pior de todos os bandidos,

Que é o político vigarista,
Pilantra, corrupto e lacaio
Das empresas nacionais e multinacionais.

Bertolt Brecht (1898-1956) 

Foi destacado dramaturgopoeta e encenador alemão do século XX. Seus trabalhos artísticos e teóricos influenciaram profundamente o teatro contemporâneo, tornando-o mundialmente conhecido a partir das apresentações de sua companhia o Berliner Ensemble realizadas em Paris durante os anos 1954 e 1955.
Ao final dos anos 1920 Brecht torna-se marxista, vivendo o intenso período das mobilizações da República de Weimar, desenvolvendo o seu teatro épico. Seu trabalho como artista concentrou-se na crítica artística ao desenvolvimento das relações humanas no sistema capitalista.

28 de maio de 2012

Política sob o ponto de vista de Arnaldo Jabor

Sabe que talvez o Deputado Sérgio Moraes tenha razão. A opinião pública neste país não serve para nada, nós somos os cabeças duras. Nós não entendemos ainda que políticos como ele, que são maioria na Câmara, foram gerados nas belas picaretagens municipais, nas malandragens escusas, nos sacos puxados, nos golpinhos das prefeituras, nas propinas de empreiteiros.

Nós não entendemos ainda que eles não tem sentimentos velhos como os nossos. Sentimentos como interesse público, amor ao país e outras bobagens. Nós somos bobos, não sacamos ainda que eles moram em outro país chamado Congresso, onde as leis são feitas para eles mesmos.

Chamamos de roubo de dinheiro público, o que para eles é apenas um delicioso uso-fruto do maravilhoso cinismo da moderna falta de vergonha. Achamos que eles foram eleitos para legislar. Quando não estão no Congresso, apenas para construir castelos, arrumar uma grana fácil, empregar parentes, pegar umas propinas.

Nós não sabemos de nada, principalmente os que elegeram sete vezes Sérgio Moraes, que responde a oito processos inclusive com um suposto envolvimento com um caso de prostituição. Por isso guardem esse nome, Sérgio Moraes, ele é o novo. Nós já éramos. Abaixo a opinião pública.

Por que somos um dos países
com o pior sistema de educação do mundo?
Quais são as causas profundas dessa vergonha?

Bem, primeiro, porque educação não traz votos. Escolinhas limpas, quem liga para isso? Mesma coisa com a saúde. São problemas de puro interesse social, e isso não elege ninguém. Obras só interessam quando dão lucro eleitoral ou lucros em roubos privados.

Nas escolas, dá para roubar na construção, nas merendas, mas é coisa pouca, é mixaria. Na saúde, ainda dá para roubar bem mais, desviando remédios, com superfaturamentos, etc.

Mas repensar a estrutura geral da saúde também não dá grana. E dá muito trabalho! Bom é ganhar votos e roubar em grandes viadutos, barragens faraônicas, canais épicos.

Além disso, no Brasil, como diz o Lula, desde Cabral a educação foi programada para não haver. Portugal e a burguesia secular jamais quiseram que o povo aprendesse.

Educação é liberdade, entendimento, perigoso!

Até o século 19, tinha de haver autorização do governo para a publicação de livros, sabiam?

Está entranhada na alma brasileira a ideia de que pobre não precisa estudar. E muita gente acha que é até melhor que sejam analfabetos. São mais fáceis de enganar, basta que saibam servir.

Arnaldo Jabor
É um cineastaroteirista, diretor de cinema e TVprodutor cinematográficodramaturgocríticojornalista e escritor árabe-brasileiro.

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